quinta-feira, 30 de janeiro de 2014

Corredores dos ventos


Areia empapada chega com a brisa quente.

Quer se arrepender agora?
Que seja:
o universo já não é mais seu nem nosso.
Seguimos uma viagem sem algum caravansarai para repouso.

– Eu estava onde os ventos mudam suas direções,
negociando corredores de labaredas perfumadas,
girando a roleta dos continentes e oceanos.

Somente o poeta tem como pátria a tempestade
o vento que faz a rede fina cantar canções de nenhum nino,
ter a obrigação de desobrigar o silêncio
descobrir a estrela das solidões como juramento de sangue
ter em cada dente uma espada que fere
e leva a bandeira do oprimido,
estar sempre do lado errado e errático da existência,
e as palmeiras fazendo alas de oásis
são o correto segundo que a aventura vive.

Ter do insulto
a certeza do sal,
logo eu que fascinei na tempestade
urrando de prazer para quando os mais próximos trovões ribombavam!
Eu que perambulei pelas ruas das rosas
e vi
nas damas ganhando a vida
os mais claros sinais apartando-me do real.

Se há uma estrela de asas no firmamento
das muretas dos mares,
que seja pelo menos uma parte de mim
em cada parte de todos os portos do mundo.

E quanto a rosa,
a rosa ruma beijando tormentas,
ondulando aos ventos rubros do entardecer
que era e é noite,
levanta os homens de suas salas importantes
tanto quanto âncoras sem navios,
rosa-se de feridas e de prantos
fecunda a ira do explorado na noite hóspede
argila que cresce secreta e comigo,
do dia em que o lavrador cansa e se abandona,
cristalina rosa que traz unguento profundo para minhas palavras usadas,
sonhando salvar a raça inteira,
que ela mesma não quer ser salva de nada:
eis aí o poeta.

Areia empapada chega com a brisa quente.

30/jan/14

A. Nassaralla

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

PÔR-DO-SOL NO MAR




Pôr-do-sol com todas as nervuras expostas
da viagem de outro dia,
de estar no mundo como viragem de astronaves
pegando o corpo fluido do verão
liberto e de partida para o coração

Fora do mapa estou e está a noite sabida de prontidões.


Virgem é quem vaga no espaço para se perder do sempre,

ser novo a cada volta que a vida dá
a cada lua que a fase derruba:
ser novo sete vezes a cada amanhecer recortado
na luz límpida das últimas estrelas.

São-me irmãs as ventanias que anunciam tempestades:

tão corro com elas carregadas na umidade,
agarrado à música de prata e ao assovio da terra perfumada,
que tenho por abraço a envolvente palha fresca
quanto de vento
um lenço macio ao carinho.

E você, amada

é quem pode para a liberdade
é quem abre para todas as loucuras que tento esconder
quando corro pela vida como um sândalo entorpecido de orvalho
evaporoso de lânguidas semi-luas nuas de estrada.

E porque vago,

vago tardes inumanas e abastecidas com o oceano das misérias,
é que posso um pouco mais me firmar com o itinerário dos perdidos.

Você, amada

um pouco que atenua a melhor solidão
que um piano-de-cauda-quebrado-poeta pode ser.

Vamos, então

correr a tarde veraneia sob o torpor dos longes,
dos litorais abastecidos de gozo
a tristeza sendo a novidade encerrada
a eternidade que se ama nos sunsets um atrás do outro
pelo mundo afora,
plantar na raiz da rosa o sorriso livre de castigos,
ser de novo o menino a correr do tamanho da seda do sol
com o tempo cabendo inteiro nos braços
e deitado na grama
feita de tapetes ornados à púrpura e esmeralda dos sonhos.

Haverá o dia em que remarei águas tranquilas


02/jan/14


A. Nassaralla